Iniciativas e resistência africanas na África oriental, 1880-1914


Iniciativas e resistência africanas na África oriental, 1880-1914
Henry A. Mwanzi
Essa classificação é resultado das lutas nacionalistas pela independência na África e no resto do mundo. Os envolvidos nessas lutas tendiam a considerar-se herdeiros de uma longa tradição de combate, que remontava aos começos do século actual, se não a antes. Em consequência, todos quantos se haviam oposto à penetração europeia na África, em defesa de sua independência, eram heróis a serem tomados como exemplo e aos quais se devia reservar um lugar de honra na história do país que tivesse ganho a independência através da resistência à dominação colonial.
No período colonial, as autoridades referiam-se aos que resistiam como pouco atilados, e aos que colaboravam, como inteligentes. Os actuais historiadores nacionalistas da África oriental condenam os pretensos colaboradores, especialmente os chefes, e louvam os resistentes. No período colonial, as autoridades referiam-se aos que resistiam como pouco atilados, e aos que colaboravam, como inteligentes. Os actuais historiadores nacionalistas da África oriental condenam os pretensos colaboradores, especialmente os chefes, e louvam os resistentes. As opções que se lhes ofereciam e a interpretação que eles lhes davam podem ter sido diferentes das que lhes impuseram os políticos e intelectuais. Na década de 1890, período que precedeu a ocupação europeia da África oriental, as sociedades da região haviam atingido diferentes etapas de organização social. Algumas delas, como a dos Baganda e a dos Banyoro, em Uganda, a dos Banyambo, em Tanganica (actual Tanzânia), e a dos Wanga, no Quênia, tinham elevado grau de centralização política. Nessas sociedades, as reacções à penetração estrangeira foram em geral decididas pelo rei ou pelos dirigentes. O que na Europa vigorou em certa época, “a religião do rei é a minha religião”, resume bem essa atitude. Outros grupos, como os Nyamwezi, na Tanzânia, ou os Nandi, no Quênia, estavam em vias de constituir governos centralizados. As diversas sociedades haviam tido diferentes níveis de contacto com os europeus ou com os árabes, duas forças externas que nessa época se defrontavam na África oriental. Os Baganda e os Wanga do Quênia haviam tido, antes da década de 1890, contacto com mercadores árabes de marfim e de escravos.
As condições atmosféricas de toda a região provocaram secas e consequente escassez de alimentos. Houve ainda epidemias de peste bovina, algumas sociedades foram mais atingidas do que outras pelas catástrofes naturais. As sociedades pastoris, como os Massai do Quênia, parecem ter sofrido mais com os problemas ecológicos. Algumas famílias Massai, como os Waiyaki e os Njonjo, refugiaram-se junto de seus vizinhos Gikuyu, onde iriam desempenhar um papel diferente, em relação tanto à penetração colonial como ao sistema colonial que se instalou em seguida; seu papel foi igualmente importante na sociedade pós- colonial.
O colonialismo penetrou numa região que já experimentava uma crise económica com todos os seus efeitos negativos.
Rivalidades europeias e resistência Africana no oriental
As lutas coloniais na África oriental envolviam três potências rivais: o sultanato
De Zanzibar, a Alemanha e a Inglaterra. Os primeiros em cena foram os
Árabes de Zanzibar, que tinham interesses essencialmente comerciais na costa e
No interior relacionados com o marfim e o tráfico de escravos. No final do século, os interesses árabes no interior da África oriental começaram a ser ameaçados pelos interesses dos alemães e dos Britânicos, que haviam penetrado pouco a pouco na região.
Os europeus do interior, comerciantes e missionários, desejavam que seu
Governo ocupasse a África oriental, para lhes garantir segurança e lhes permitir
O desenvolvimento de seus empreendimentos sem problemas. Os métodos de conquista europeia não foram os mesmos em todo lugar.
De maneira geral, caracterizaram-se pelo emprego da forca, em combinação,
Quando possível, com alianças diplomáticas com um grupo contra outro.
O recurso a forca tomou a forma de invasões, que também eram espectáculo de pilhagem. Os alemães também construíram estradas e ferrovias, A primeira estrada De ferro partiu de Tanga em 1891 e alcançou o sope dos montes Usambara em1905

A reacção no Quénia
Os Nandi do Quénia, opuseram se militarmente a construção da estrada de ferro em seu território, de todos os povos do Quénia, foram eles que apresentaram a resistência mais viva e prolongada ao imperialismo britânico, O crime enfraqueceu a resistência dos Nandi, o que possibilitou a ocupação do território pelos britânicos. A sociedade se em unidades territoriais, chamadas pororiat.
As tropas relacionavam se com ele através de um representante pessoal, com assento em cada conselho territorial. Sendo o território, mais do que o clã, o centro da vida social nandi, não havia rivalidades entre clãs. A sociedade, por consequência, era muito unida, coesão que lhe conferia superioridade militar sobre seus vizinhos. A coesão social e a confiança dos guerreiros tanto em si mesmos como em seu chefe fizeram dos Nandi uma forca militar com a qual era preciso contar.
As vitorias acumuladas levaram nos a pensar serem superiores aos outros povos,
entre os quais, os brancos. Os Nandi, resistiram com êxito por mais de sete
anos a ocupação estrangeira por causa da forca combativa da sua sociedade.
Essa atitude contrasta vivamente com a de outras comunidades do Quénia.
No centro do pais, cada chefe, grupo ou cla reagiu em separado
a invasao estrangeira. A cerimónia da fraternidade de sangue era a mais alta expressão deconfianca entre os Gikuyu. Depois desse tratado, Waiyaki autorizou Lugard a construir um forte em seu território.A conduta de Waiyaki ilustra bem o fato, por vezes mal conhecido, de que ninguem eraali “colaborador” ou “resistente” a vida inteira. As pessoas mudavam de táctica conforme as circunstância e, provavelmente, a medida que se aprofundava sua compreensão das forcas atuantes. A situação colonial nao tinha nada de estático: era dinâmica, assim como as reacoes dos africanos.No litoral, a familia Mazrui resistiu aos artificios da Ibeac. A resistência foiencabecada por Mbaruk Bin Rashid, que organizou uma guerra de flagelação contra as forcas britanicas, superiormente equipadas. Foi preciso mandar virtropas indianas para venceia. Mbaruk Bin Rashid fugiu para o Tanganica e caiunas maos dos alemaes. A resistência dos Mazrui devia se as tentativas britanicasde interferencia nos assuntos internos das sociedades do litoral. do litoral. Entre 1877 e 1883, os Giriama opuseram se a tal controle, e estalou a guerra entre os dois grupos. Os Mazrui foram batidos. Posteriormente, as duas comunidades reconciliaram se e tornaram se socias no comercio. A chegada dos britanicos ameacava o acordo e a organização interna da sociedade Mazrui, o que motivou sua resistência a dominação britânica. Em 1895, morto o vali de Takarungu, a companhia escolheu um aliado local para suceder lhe, em lugar de Mbaruk, cujos direitos ao trono eram mais fundamentados, mas que sabia se não favorecer a presenca britanica. Foi por essarazao que Mbaruk  tentou expulsar pela forca os ingleses da costa. Os agentes da
companhia pilharam as areas vizinhas, apossaram se dos alimentos e dos bensdos Akamba essencialmente, cabras e bovinos. No norte do Quenia, nos confins do interior do pais Kisimayu, os OgdensSomalis, a familia Mazrui e os Akamba combateram a intrusao inglesa. Novamente
foi preciso mandar vir tropas indianas para vence-los (1899). O combate durou cerca de 20 minutos. Por fim, o inimigo fugiu em todas as direcoes, deixando grande numerode mortos, inclusive Mwangeka”. O proprio capitao Nelson, bem como 11 de seus homens, foi ferido pelas flechas envenenadas dos Taita. Alhures, no Quenia ocidental, entre os Abaluyia, o tipo de reacao foi omesmo: confrontos militares e aliancas diplomáticas. Paralelamente, os ingleses viam nele um agente docil, que os ajudaria a ampliar seu controle a toda a região. E, de fato, a ocupação britânica deveu se em grande parte a Múmia.

A reacção no Tanganica
No Tanganica tipo de reacção foi semelhante ao do Quénia: emprego da forca e alianças diplomáticas. A população, mestica de africanos e árabes (oscasamentos inter-raciais eramcomuns), ocupava-se do comércio local. Abushiri, o chefe da resistência, nascera em 1845, de pai árabe e mãe oromo. Era descendente de um dos primeiros colonos árabes do litoral colonos que acabaram por se considerar autoctones. Lançou-se também numa campanha contra os Nyamwezi, o quelhe permitiu arregimentar guerreiros, mais tarde empregados contra os alemães. Sob seu comando, os povos do litoral incendiaram um navio de guerra alemão em Tanga, no mes de Setembro de 1888, dando dois dias aos alemães para
Evacuarem a costa. Não faltou quem pegasse em armas, no Tanganica, para defender a independência. Mas os alemães, tal como os ingleses no Quénia, tinham se tornado mestres na arte de dividir para reinar, aliando-se a um grupo contra outro. E encontraram bastantes aliados. Os Marealle e os Kibanga, que viviam perto do
Kilimandjaro e dos montes de Usambara, para citar apenas dois exemplos –, estavam entre aqueles que viam nos alemães um meio de fazer amigos para vencer os inimigos.



A reacção em Uganda

Após vários combates em que suas tropas foram vencidas, Kabarega recorreu a diplomacia. Por duas vezes tentou um entendimento com Lugard, mas este se esquivou27. Mwanga, o kabaka de Buganda, por mais de uma vez tentou interceder pelo rei de Bunyoro, mas em vão. Afinal, Kabarega recorreu a guerrilha – provavelmente, a primeira do género na África oriental. E provável que o maior diplomata, de entre todos os chefes que enfrentaram o avanço do imperialismo na África oriental durante a ultima década do século
XIX, tenha sido Mwanga, kabaka de Buganda, região declarada protectorado britânico em 1894. Tão logo subiu ao trono, em 1894, parecia desconfiar dos
Europeus (os missionários, na época) e procurou restringir o contacto de seu povo com eles. Ora se aliava as duas seitas cristas protestantes e, católicos contra os muçulmanos, por imaginar que estes se haviam tornado muito poderosos e ameaçavam seu poder no país; ora se aliava aos muçulmanos contra católicos e protestantes; segundo pensava, uns e outros eram perigosos para ele. Mwanga, portanto, era adepto da regra “dividir para reinar” – regra que as potências coloniais tão eficazmente empregaram para controlar a África. Kisimayu, onde morreu em 1903. Mas também havia entre os Baganda os que celebraram estreita aliança com o imperialismo britânico era o chamado subimperialismo baganda relativamente ao resto de Uganda. Agentes baganda, principalmente depois do acordo de 1900, encarregaram-se de disseminar o colonialismo inglês por todo o país.

A África oriental sob o domínio colonial
As potencias coloniais resolveram transformar a região tanto no nível politico como o que e mais importante no nível económico. Uma das primeiras actividades económicas, conforme vimos, foi a construção de ferrovias, ligando, no Tanganica, as montanhas de Usambara as regiões de Kilimandjaro, e, no Quénia, o litoral a bacia do lago Vitoria. Com as estradas de ferro, chegaram os colonos europeus. O objectivo era dirigir as economias da África oriental para a exportação, tornando a região dependente dos arranjos económicos feitos na Europa. Ukambani foi a primeira área do Quénia ocupada por eles em fins da década de 1890. Mas, de todos os povos da região, foram os Massai a perder maior quantidade de terras devido a essa colonização.
Embora os hindus tenham sido empregados na construção da estrada de ferro de Uganda, foram excluídos dessa área. Eliot, favorável a reivindicação, confinou os hindus as terras que margeavam a linha férrea. A política de exclusão dos hindus das terras altas foi adoptada por todos os comissários do protectorado e governadores coloniais posteriores a Eliot. Os hindus reagiram constituindo associações próprias para pressionar as autoridades a dividirem as terras altas. A situação era diferente no Tanganica e em Uganda. No Tanganica, para começar pela parte meridional do país, os africanos foram estimulados pelos brancos a principio, os missionários, depois, as autoridades coloniais, a se dedicar as culturas de exportação, basicamente algodão e café. Alem disso, foram criadas fazendas colectivas para a cultura algodoeira. Em 1908, os africanos produziam dois terços das exportações de algodão do Tanganica e, em 1912, mais de 70% do total dessas exportações. A extensão das mudanças ocorridas no Tanganica pode ser aferida pelo volume de maodeobra assalariada.
O acordo de 1900 procedeu a distribuição de terras em Buganda com vistas a criar uma classe de proprietários fieis ao sistema colonial. Essa distribuição conduziu a formação de diversas relações de classe e de propriedade, desde o aparecimento dos rendeiros e dos proprietários de terras. Por outro lado, o acordo afirmava que Uganda devia ser um país onde predominaria a produção agrícola africana.
Estava ai, um dos factores que serviram de barreira ao povoamento branco em grande escala, como se vê no Quénia e no Tanganica. A produção de culturas de exportação tornar-se-ia o esteio da economia ugandense. O que havia começado em Buganda estendeu-se finalmente a outras regiões da colónia, sobretudo a oeste, onde o clima, como o de Buganda, era favorável. Em 1907, o algodão produzido dessa maneira representava 35% das exportações do país. De modo geral, em vésperas da Primeira Guerra Mundial, as transacções monetárias estavam bem desenvolvidas em Uganda, bem como no resto da África oriental. A introdução de impostos não tinha tanto o objectivo, pelo menos, não unicamente, de aumentar a receita das colónias, mas de obrigar os africanos a deixar suas terras para se integrarem no mercado de trabalho e na economia monetária. A obra era empregada nas fazendas dos colonos e em obras públicas, como a construção de estradas.




Movimentos anticolonialistas na África oriental até 1914

 No Quénia, como em outras regiões da África oriental, as primeiras reacções de povos como os Mazrui e os Nandi tinham por finalidade proteger sua independência em face das ameaças estrangeiras. As reacções ulteriores, no Interior do pais, visavam livrar o povo da opressão e da dominação coloniais. Em 1913 apareceu então o culto Mumbo, movimento contra o domínio branco, mas que utilizava a religião como ideologia. Do país Lua, expandiu-se para os Gusii, mostrando assim que era capaz de conquistar outras regiões do Quénia. O movimento teve inicio em 1911, impulsionado por uma mulher, chamada Sistume, que se dizia possuída pelo Espírito. Mas logo assumiu sua direcção um jovem, Kiamba, que o transformou em oposição política ao colonialismo no Quénia.
De modo geral, os primeiros movimentos anticolonialistas do Quénia, no
Período anterior a Primeira Guerra Mundial, surgiram nas regiões ocidentais e orientais do país. Os Giriama da região costeira aproveitaram o conflito para se revoltarem contra a administração colonial (1914), recusando-se a abandonar suas terras para permitir o assentamento de colonos europeus.
O levante de 1914 foi, portanto, o ponto culminante de uma serie de confrontos com o ocupante. Os britânicos reagiram incendiando as casas e confiscando as propriedades. Os Giriama, tal como os Mazrui e outras comunidades, lançaram se numa espécie de guerrilha, mas afinal foram vencidos. Comparada ao Quénia, Uganda era bem mais tranquila. Ainda assim, em 1911, os Acholi, na parte setentrional dos pais, revoltaram se contra o domínio colonial inglês. Os Acholi recusaram‑se a entregar voluntariamente seus fuzis, mas foram vencidos no conflito que se o mais grave desafio ao colonialismo na África oriental, nesse período levante dos Maji Maji, veio do Tanganica, com o emprego da religião e da magia como meios de revolta. Os trabalhadores recebiam paga tão irrisória que alguns se recusavam a aceita-la.
A reacção não se deu contra a cultura do algodão em si, que eles já praticavam com vistas a exportação, mas ao tipo de cultura a eles imposto, que não só explorava seu trabalho como constituía uma ameaça a economia africana, pois eram forcados a
Deixar suas próprias fazendas para trabalhar nas empresas agrícolas públicas.
O levante Maji Maji foi o primeiro movimento de grande escala da África oriental. Nas palavras de John Iliffe, foi “a derradeira tentativa das antigas sociedades do Tanganica de destruir a ordem colonial pela forca. Tratava se efectivamente de um movimento camponês de massa contra a exploração colonial. O regime alemão no Tanganica ficou abalado, e sua reacção não se limitou a esmagar o movimento: a política comunitária de cultura do algodão foi abandonada.
Houve igualmente algumas reformas na estrutura colonial – especialmente no que concerne ao recrutamento e a utilização de mão-de-obra, destinadas a tornar o colonialismo mais atraente.


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